sexta-feira, 12 de novembro de 2010

"a verdadeira afeição na longa ausência se prova"

80 dias longe dele, 60 dela. e um choro doído que não cessa. uma saudade que bateu pra castigar; que trouxe a vontade do único cafuné autorizado a bagunçar meu cabelo; que tornou quase real a sensação de beijar o rosto gostoso da barba recém-feita cheirando a malbec.

se eu estendesse os meus braços agora, eu tenho a certeza de que poderia fechá-los no tamanho exato em que coubesse cada um dos dois no abraço mais apertado do mundo.

acho que hoje não é, enfim, saudade. tá mais para a expressão física exata do termo “falta”.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

feijoada transmontana

em coimbra, universitário miserável só é também morto de fome se quiser. além de todos os produtos absurdamente baratos que você encontra nos supermercados, e do programa que te ensina a combiná-los inteligente e deliciosamente, a universidade oferece uma diversidade considerável de pratos a preços bem razoáveis: além dos bares que você encontra em todas as faculdades (o da letras sempre me lembra do da faculdade de economia da ufmg, em cardápio e preço), o complexo universitário possui – como eu acabei de verificar – 15 cantinas.

o que eles chamam de “cantina” por aqui é o nosso velho conhecido “bandejão”. minto: nosso, não, porque eu devo admitir que almocei no bandeco da ufmg apenas uma vez durante todo o meu curso, logo no meu primeiro mês de caloura. sempre tive uma preguiça absurda de atravessar meio campus debaixo do sol de meio-dia para comer uma refeição que, na única vez experimentada, parecia se avolumar cada vez mais quando já dentro do meu estômago.

mas, tendo que comer em euros, e nem sempre com paciência ou tempo para fazer as receitas que eu passo no caçarola (último merchandising, prometo!), ganhei bem mais disposição para conhecer o que as cantinas daqui tinham a oferecer.

e não me decepcionei! bom, não muito. a maioria delas oferece diariamente o prato social, que consiste em:

1 pão
+
uma tigela de sopa
+
um prato com uma das opções do dia (são duas ou três, geralmente)
+
uma garrafinha de água ou um copo de suco (de amarelo, igual ao do bandeco)
+
uma fruta, ou uma sobremesa (arroz doce ou leite creme.. recomendo ambos!)


o preço desse combinado é €2,40. por alguns cêntimos a mais, você pode trocar a sua água por um refrigerante, ou mesmo (sério!) uma cerveja, um vinho. também é possível variar nas sobremesas.

mas muitas das cantinas oferecem ainda outras opções para quem não aguenta comer a mesma coisa toda semana: na cantina amarela (que leva esse nome pela cor das mesas e cadeiras), há sempre uma ou duas opções de pratos vegetarianos, além de um quiosque que vende baguetes numa versão mais modesta do subway; na cantina azul (adivinhem...), fica também o “snack bar”, que serve os pratos mais elaborados e tradicionais da culinária portuguesa; no mesmo edifício da cantina azul, fica também a cantina de grelhados, em que você escolhe a carne que mais te apetece, e ela vem acompanhada de arroz, salada e batata frita; nunca estive na cantina do estádio municipal para saber se há lá algo de especial, mas sempre me dizem que a comida lá é mais gostosa.


e, por falar em arroz, devo dizer que a relação que desenvolvi com o arroz das cantinas da uc é um bocado estranha. os que me conhecem mais intimamente sabem que o arroz é o componente mais fundamental de todas as minhas refeições – chegando, por vezes, a ser o único. minha mãe pode confirmar isso com incontáveis histórias de situações em que ela se esmerou ao máximo para preparar algum saboroso e diferente prato para o almoço, e recebeu da minha parte comentários elogiosos apenas sobre o arroz.

o arroz da minha mãe sempre foi campeão: torrado e cozido na medida certa, branquinho, soltinho, com aquele gostinho especial de alho. e o arroz da minha mãe é o OPOSTO do arroz das cantinas da universidade, que consiste numa bolota levemente massuda de medida padrão e meio encardido, cozimento (a meu ver) incompleto e pouco tempero. o caso é que eu desenvolvi uma danada de uma relação de dependência com esse arroz da cantina! e nem adianta justificar que é conformismo diante da necessidade de ter o grão nas minhas refeições. isso porque, às vezes, eu consigo reproduzir em casa algumas cópias quase fiéis do arroz da mamãe, mas o como pensando no quanto o trocaria facilmente pelo das cantinas.

esse tipo de relação errada e doentia me fez estragar o almoço de ontem, persistindo no prato social de quinta-feira que vem acompanhado de arroz: a feijoada transmontana.

essa é a feijoada transmontana, tal como é servida nas cantinas:

foto do meu prato de ontem. não dá pra ver na foto, mas juro que o arroz é encardidinho!

eu me lembro da primeira vez em que a experimentei. estava na fila, esperando para ser servida, e acompanhada de vários brasileiros que, como eu, foram atraídos para lá pelo convidativo nome, que nos criava a expectativa de feijão preto, linguiça e paio. nos meus pensamentos mais ousados, eu ainda me permitia sonhar com uma farofa e com a imitação portuguesa bem digna da couve.

acho que vocês podem imaginar a cara de decepção de todos quando alcançamos um lugar em que já podíamos dar uma espiada no prato, que, no final, tinha uma inclinação muito maior para se passar por dobradinha. um dos garotos que estava comigo, nesse momento, aproveitou que estávamos na cantina amarela e decidiu que era uma boa hora de tentar ser vegetariano, fugindo rapidamente para outra fila. os outros e eu resolvemos encarar.

não rolou. pelo menos para o meu paladar, a feijoada transmontana é um erro, seja como feijoada, como dobradinha, ou como “feijão com tranqueiras”. mas o prato foi, pelo menos, a sensação daquele dia. ao fim do almoço, nos intervalos da aula, pelos corredores da ruc, eu ouvi pelo menos cinco vezes uma conversa bem semelhante:

_e aquela feijoada, hein?
_feijoada? com repolho? hahahahahaha, tá bom!
_não tinha carne, só gordura!
_faltava sal!
_feijão duro, po...
_e o que era aquele mato não identificado ali no meio?

percebi o quanto pegar um nome emprestado da cultura do alheio pode ofender seriamente esse alheio. penso que seria como oferecer ao português um bacalhau com natas feito com peroá e que levasse batatas doces no lugar das inglesas.

mas eis que, ontem, entre o bacalhau à gomes de sá, que só vinha acompanhado de salada, e do feijão usurpador que me prometia um montinho do duvidoso arroz que caiu nas minhas graças, acabei me forçando a acreditar que, dessa vez, por estar na cantina azul e não na amarela, poderia experimentar alguma melhora no prato.

nenhum sucesso. e já deu de feijoada transmontana pra mim. não importa o que digam, não como nem a da cantina do estádio.

domingo, 24 de outubro de 2010

coimbra songs

amália rodrigues cantou há um bocado de tempo atrás o que vocês provavelmente conheceram pela voz do roberto carlos:

coimbra das canções
coimbra que nos põe
os nossos corações à luz
coimbra dos doutores
pra nós os seus cantores
a fonte dos amores és tu.

mas o que os doutores de coimbra cantam? durante as serenatas, o bom e tradicional fado, claro. mas, no cotidiano universitário dessa cidade, o que se ouve sendo entoado nas ruas, nas festas, nos ônibus, e ao pé da janela da sala onde você está tentando se concentrar em entender o que o profesor diz são canções nada melancólicas, tampouco ligadas ao destino português.

isso não significa, no entanto, que elas também não sejam tradicionais! aliás, eu sou capaz de apostar que alguns jovens portugueses têm na ponta da língua todas as músicas que eu apresentarei, mas talvez encontrem alguma dificuldade em recitar por inteiro qualquer música da diva fadista acima citada.

não posso culpá-los por isso. a combinação de fatores que as compõe, incluindo a situação em que são cantadas, fazem com que elas grudem na sua cabeça com uma facilidade absurda. não demora muito para que você também fique à procura do momento certo para soltar uma delas.

muitas delas são constituídas de letras quase sempre pesadas – algumas sendo, inclusive, impublicáveis neste blog de respeito – associadas a melodias de músicas que todo mundo conhece. dos engenheiros, por exemplo, o que mais se ouve é uma versão de “yellow submarine” que seria vetada com muito mais força que a releitura de “i want to hold your hand” proposta pela rita lee foi.

algumas são como hinos para os cursos. outras são hinos para a faculdade inteira. e algumas são apenas um fundo para incentivar a bebedeira desenfreada, como as duas primeiras que apresento a seguir.

“mão direita é penalty...” e “bebe essa merda”

começo por uma que, pelo que já pude perceber, não foi criada aqui, e parece ser bem popular em todo o país.

lembro-me de alguém ter me contado que, aqui em portugal, não se pode beber vinho com a mão direita. não é apenas errado, mas ofensivo para o português. para ensinar isso aos que vêm de fora, criou-se uma perigosa lição: sempre que alguém flagra uma pessoa bebendo algo (e não precisa ser exatamente vinho... não aqui, pelo menos) com a mão direita, canta-se:

mão direita, mão direita
é penalty, é penalty, é penalty...

para os apressadinhos, a música começa lá pelos 36 segundos de vídeo



e a pessoa é obrigada a beber todo o conteúdo do copo de uma só vez. no brasil, essa situação certamente pediria um “vira, vira, vira, virooou!” enquanto a pessoa estivesse cumprindo sua penalidade.

em coimbra, o fundo musical para o momento é o refrão de “can’t take my eyes of you”. modificada, é claro, para

bebe essa merda, lá lá lá lá lá lá
bebe essa merda, lá lá lá lá lá lá...

o áudio do vídeo é MUITO ALTO! cuidado com os ouvidos!



“f-r-a-” (“éfe-érre-á”)

essa é tradicionalíssima! e tem história, que eu achei na wikipédia:

o grito académico português, ou F-R-A ("éfe-érre-á"), acrónimo de frente revolucionária académica, é um grito exuberante lançado pela comunidade académica portuguesa como saudação de honra ou mera manifestação de alegria.

criado originalmente na academia de coimbra como 'arma' de luta política, pensa-se que terá sido dito pela primeira vez pelos quintanistas de medicina, na noite de 26 de maio de 1938.

a música talvez já tenha sido esvaziada de seu sentido primeiro, mas continua igualmente empolgante! como eu só ouvia onomatopeias e interjeições esquisitas sempre que alguém puxava o f-r-a, acabei perguntando ontem para o murillo, que é caloiro, o que exatamente dizia a música. e, no fim das contas, a letra não está tão distante da minha impressão inicial. geralmente, ela é entoada em forma de pergunta-resposta entre um “puxador” e a malta (= turma, galera. faltou essa no meu nanodicionário, hein!):

_então malta, para
este nosso colega,
não vai nada,nada,nada,nada?

_tudo!

_mas mesmo nada,nada,nada,nada?

_tudo!

_então, com toda a cagança,
com toda a pujança
e do fundo do coração,
aqui vai um...F-R-A!

_Frá!

_F-R-E

_Fré!

_F-R-I

_Frí!

_F-R-O

_Fró!

_F-R-U

_Frú! Frá-fré-frí-fró-frú!
Áli-quá-li-quá-li-quá! (bis)
Chiribiribi -tá-tá-tá!(bis)
Hurra! Hurra! Hurra!



“coimbra é nossa”

essa é, definitivamente, a minha favorita! talvez porque me lembre os meus tempos de mineirão com o meu pai, cantando “é cruzeirô! é cruzeirô!”, já que a melodia é a mesma; ou talvez porque resuma o meu sentimento quanto à cidade de uma forma nada romântica, fato, mas bem fiel:

coimbra é nossa!
coimbra é nossa!
coimbra é nossa e há de ser...
coimbra é nossa e há de ser,
coimbra é nossa até morrer!



esse post é uma pequeniníssima amostra das coimbra songs que tenho aprendido diariamente. está aqui mais uma prova de que, em coimbra, ter uma divertida vida universitária é coisa séria.


quem fala português? - parte 2

eu tenho muito para contar sobre a latada, mas deixarei isso para a quinta-feira de cinzas coimbrã, quando já tiver visto e vivido de tudo, e tiver noção do tamanho do estrago que ela fará aos estudantes da universidade.

por isso, enquanto me recupero da madrugada de ontem e ainda considero a ideia de aproveitar a de hoje, sentei ao computador para falar de outra coisa.

o que acontece é que, ontem, enquanto eu praticamente cambaleava pela latada – e não, eu não acho isso bonito –, alguém me chamou no meio da confusão e começou o seguinte discurso veemente, mas risonho:

_ ei, eu sei onde fica belo horizonte, e eu vou te falar agora: é a capital de minas gerais! eu colori os mapas na 4ª série, e a minha família é de barbacena, que fica a duas horas da sua cidade!

quem dizia isso era a julia allevato. porque eu estava bastante alterada e ela parecia estar na mesma condição, eu a princípio não entendi nada do que era aquilo. até que eu me lembrei dela, e vocês certamente se lembrarão, também.

a julia foi a garota carioca que eu conheci no meu primeiro dia sozinha em coimbra, e sobre quem eu postei a seguinte mensagem no meu mural do facebook:

lembra da 4ª série, quando a gente fazia uns exercícios pra decorar os estados brasileiros e suas respectivas capitais?

pois eis que hoje me chega uma menina do rio e me pergunta: "de onde você é?". eu respondo "belo horizonte!" e ela devolve "onde fica essa cidade?".

qué dizê...

naquele mesmo dia, a julia acabou me achando entre os contatos da fê, viu a mensagem, e eu nem sei se ela pensou em me adicionar por lá, mas eu imagino que, se a vontade houve, ela passou no momento em que ela reconheceu ser a personagem do meu relato.

acontece que, na ocasião, ocorreu à julia o mesmo que me ocorreu quando eu conheci a fê, e o mesmo que me acontece diariamente no meu contato com os portugueses: não familiarizada ao meu belorizontinês de palavras pronunciadas pela metade, ela não conseguiu entender que “belzôntchi” era a capital do estado vizinho ao dela, conforme ela aprendeu na 4ª série e nunca mais esqueceu, assim como eu. e ao contrário de mim, que nessas situações sempre opto pela tática de apenas soltar um “huuuum!” e nunca saber o que realmente me disseram, a julia parece mais disposta a fazer um esforço extra para entender as pessoas.

eu nem preciso ressaltar que, visto que minas são muitíssimas, ter descendência barbacenense não necessariamente a deixa preparada para travar uma conversa comigo sem equívocos linguísticos, né?

junto com essa retratação – que eu prometi à julia ontem, mesmo ela dizendo não ser necessário –, vai também o reconhecimento de que passar toda a minha vida convivendo quase que exclusivamente com um só dialeto e cultura me tornaram um bocado intolerante para receber bem de cara outros sotaques e comportamentos. e me parece que eu talvez tenha me preparado bastante para entrar em contato com os estrangeiros, mas não estava realmente aberta para aproveitar o período em outro país para conhecer um pouco mais do meu. felizmente, parece que coimbra vai acabar me curando desse mal.

quem poderia imaginar que fazer intercâmbio numa cidade de interior acabaria me deixando, na verdade, menos provinciana?


(nota: logo que esse incidente com a julia ocorreu, o henrique me alertou para o fato de que ela podia simplesmente não ter me entendido. aposto que, se ele ler isso, vai vir tirar uma com a minha cara.
)

terça-feira, 19 de outubro de 2010

babelbabelbabel!


ESTREIA DO PROGRAMA "BABEL" NA RUC (Rádio Universidade Coimbra) AMANHÃ:

para meus queridos brazuquinhas - o programa vai ao ar a partir das 17h do nosso amado varonil e pode ser ouvido aqui: www.ruc.pt . mais: para os saudosos da era coleguiana, uma homenagem quanto à música escolhida para o meu bloco de culinária, que (se não me engano) é o último do programa.

para os meus queridos erasmus - 20h. 109,7 fm! podem tratar de ouvir, pá! e sem desculpa de que não tem rádio. primeiro, porque eu tenho certeza que rola de sintonizar com o telemóvel vodafone que tooodo mundo tem! segundo, se não rolar, ainda resta o site!

visto que gravamos o programa sem cortes, o que rendeu uns 20seg de "huuuum, éeeee, hãaaa..." meus, eu fiquei seriamente com medo de divulgar logo na primeira semana de cara, mas... ah, eu quero que vocês ouçam o resultado do trabalho mesmo assim! ;D

domingo, 17 de outubro de 2010

fernanda


“we are always running for the thrill of it, thrill of it
always pushing up the hill searching for the thrill of it…”



eu conheci a fê logo que experimentei minha primeira noitada coimbrã. embora a prioridade fosse a festa erasmus, ela estava dois bares abaixo, sentada na mesa de esquina do “café tropical”, cercada de vários já novos amigos, dos quais eu conhecia apenas a bella.

ela trajava jaqueta e blusa pretas, obviamente respeitando o dress code da festa em que ela – nem eu, naquele momento – não se fazia presente.

porque a cadeira ao lado dela era a única vazia, eu acabei me sentando por ali. rodeada por brasileiros que aparentavam ser interessantíssimos, eu acabei entrando na conversa, tentando socializar. e foi ela que respondeu prontamente às minhas primeiras intervenções na conversa, me despertando uma simpatia instantânea.

perguntei o nome dela. totalmente ereta na cadeira, sorrindo abertamente, ela respondeu prontamente, fornecendo nome e sobrenome. eu só consegui pegar o “fer...” inicial. ela falava absurdamente rápido, num sotaque carregadamente paulista com o qual eu não estava familiarizada e que, por isso, não conseguia captar de pronto.

mas ela me despertava tal empatia, que eu acabei por caçá-la no dia seguinte entre os contatos de facebook da bella, procurando todos que começassem pela letra “f”, e acabando por achar facilmente a garota bonita de óculos de armação quadrada e preta. fernanda trevisan, era esse o nome que eu não havia entendido na noite anterior.

não foi preciso mais que um próximo encontro para que eu decidisse que ela seria minha amiga. estávamos nós na praia fluvial, e ela mantinha o mesmo interesse em travar alguma conversa comigo. ouvia algumas das histórias portuguesas que eu conhecia e deixava transparecer sincero interesse em conhecê-las pela minha perspectiva.

de lá pra cá, passamos não só a trocar histórias do alheio, mas a nos confidenciar os capítulos mais íntimos das nossas. e, com as histórias, vieram as descobertas dos gostos musicais compartilhados, as risadas, a confiança, a identificação, e a necessidade estar por perto diariamente.

lembram-se de que eu disse que todo o contato que se estabelece em coimbra é extremamente intenso? pois eu experimento toda essa intensidade na companhia da fê. almoçamos juntas, assistimos a aulas juntas, vamos ao cinema juntas, farreamos juntas, laricamos juntas, ou ficamos a fazer nada juntas, e eu sinto como se fosse impossível me cansar dela.

escrevo isso agora, às 6 da manhã e após uma “balada toooop” (que é como ela definiria) em sua companhia. escrevo e posto aqui, porque sei nela uma das leitoras mais assíduas do “pra ver o mundo”, e porque quero que o meu mundo conheça uma das grandes responsáveis pelo meu imenso contentamento em viver por aqui.

boas vibrações. é só o que eu sinto na fê, mesmo quando ela acha que não as está emanando.

em um mês e meio de convivência, eu já colecionei cada trejeito, expressão e pensamento da fê na memória. ligo para ela com uma notícia chocante já à espera de um “aaaaah, vai, conta tuuuuudo!”; chego na faculdade às terças e quintas já à procura daquele sorriso largo que se estende até os olhos apertadinhos; sei exatamente quais comes e bebes comprar para atrai-la para a minha casa.

e, mais do que nunca, reforço a certeza em mim de que o bom da vida é, de fato, apaixonar-se pelos bons amigos que se reconhece pelos cantos desse mundo.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

quem fala português?

advertência: post plurilíngue. e o google translator dificilmente te ajudará aqui.

uma das coisas que se estuda à exaustão no primeiro período do curso de letras da ufmg é algo empiricamente óbvio até para uma criança que tem em sua classe um coleguinha que veio de outra cidade/estado/país: nenhuma língua é una em qualquer aspecto que analisemos dela. duas pessoas que possuem a mesma língua-materna, mas origens distintas, certamente também terão distintos jeitos de expressar a mesma coisa – e isso será evidenciado na formação de uma frase, na escolha dos palavras, ou na maneira de emiti-las.

eu sei disso, e você também – com a vantagem de que você talvez não tenha passado um semestre concluindo isso duas vezes por semana.

morando num país extremamente extenso, toda viagem de férias a outro estado sempre foi uma boa oportunidade de experimentar um pouco dessas diferenças. e como elas se faziam presentes na melodia das palavras do outro, ou em uma ou outra expressão antes desconhecida, sempre foi uma diversão à parte (e, confesso, um dos primeiros motivos que acabou me levando à fale).

vinte e um anos de poucos equívocos comunicacionais realmente indissolúveis acabaram por me fazer confiante quanto ao meu domínio da língua portuguesa. não só a mim, mas certamente àqueles que selecionaram a mim e aos meus colegas para o intercâmbio sem cobrar qualquer teste de proficiência lingüística.

mas o que acontece quando, ao entrar num avião da tap, você começa a torcer o nariz para o estranho inglês da aeromoça que passa as instruções de segurança, até perceber que ela está falando, na verdade, a mesma língua que você? e como continuar tão certo da sua capacidade de se comunicar em português quando se torna extremamente necessário que te repitam a mesma coisa pelo menos duas vezes até que você consiga captar a essência da mensagem? mais: o que fazer quando você tem a certeza absoluta de que entendeu perfeitamente cada palavra dita, mas não depreendeu sentido algum delas?

não acho piada nos finos, mas é bué da fixe quem os bebe com palhinhas. esta frase faz algum sentindo para você, leitor brasileiro do blog? pois aqui ela passaria em uma conversa sem qualquer cócega cognitiva, apesar d’eu não estar certa de quando ela seria pertinente.

bem antes de vir morar em coimbra, fui apresentada ao bruno aleixo, o ex-ewok-agora-cachorro mais famoso desta cidade, que passou a me divertir gradativamente, a cada replay que eu dava em seus vídeos, com o volume ajustado no máximo, tentando entender tudo o que estava sendo dito ali.



à medida que o número de replays necessários diminuía, comecei a achar que havia encontrado na animação um bom treinamento para eventuais dificuldades que pudesse encontrar para entender o sotaque português. não resultou em quase nada. acabei por descobrir que, comparada ao verdadeiro sotaque coimbrão, a dicção do menino bruno é como a adotada pelo william bonner ao apresentar o jornal nacional.

a sensação de que a sua relação com o português passou a “lê: bem / escreve: bem / fala: razoavelmente / compreende: pouco” pode ser bem desesperadora a princípio. semana passada, um outro erasmus brasileiro que havia acabado de chegar assistiu à sua primeira aula do meu lado com uma expressão de sincero pavor, nada condizente com o caso descontraído (e ininteligível pra ele) que a professora contava.

e eu não consigo me decidir o que mais dificulta a sua adaptação ao que é, teoricamente, apenas uma variante da sua língua-materna. porque, não bastasse a gama imensa de termos e expressões desconhecidas por nós, eles ainda falam rápido DEMAIS. tão rápido, que minha mãe, tão mineira e tão essônspassnasavass? (tecla sap para os não-mineiros: esse ônibus passa na savassi?) quanto eu, ouviu de um garçom português que nós brasileiros temos todos uma “fala descansada”.

mas os dias vão passando, e os equívocos linguísticos provam quase nunca serem danosos. e, com a exposição constante a uma versão mais chiada, introvertida e rrrrrebuscada da sua língua, a sua capacidade de decifrá-los acaba melhorando rapidamente – assim como o seu conformismo para, por vezes, apenas sorrir e concordar com algo que seria inútil tentar entender.

e eu já posso dizer que estou quase que integralmente de volta à situação de me divertir colecionando curiosidades linguísticas do português. tanto que, abaixo, disponibilizo uma lista dos termos e expressões que mais me apeteceram até agora – inclusive os que farão vocês traduzirem aquela frase lá do meio do post. ah! e as que estão destacadas são as que, vejam só!, eu já incorporei involuntariamente ao meu léxico:



obs: agora, apesar de tudo que já aprendi, ainda estou procurando insistentemente por alguém que me explique por que usar uma blusa com os dizeres “acalma o grelo, a queima vem aí!” não provoca estranhamento por aqui.

domingo, 10 de outubro de 2010

hogwarts e praxes

o veterano praxista mais famoso de coimbra

eu fui uma daquelas crianças que leu “harry potter e a pedra filosofal” aos dez anos e esperou durante meses por uma carta que me convidasse a estudar na escola de magia e bruxaria de hogwarts, acreditando sinceramente que isso poderia acontecer.

essa carta nunca chegou. ou talvez não tenha chegado até junho deste ano, quando recebi um envelope enviado daqui de coimbra, dizendo que eu poderia vir fazer o intercâmbio.

foi por causa dessa carta que vim estudar em meio a construções muitíssimo antigas e imponentes frequentadas por alunos trajando... capas? pois é. se você já foi (ou é, que mal há nisso?) fã de harry potter, deve saber que j.k. rowling começou a escrever a saga quando morava aqui em portugal. acho que posso arriscar palpites sobre de onde vieram algumas de suas inspirações.

brincadeiras à parte, eu posso não estar em uma escola de magia e bruxaria – e isso talvez se deva unicamente ao fato de que nunca entrei na faculdade de ciências farmacêuticas –, mas definitivamente não estou num ambiente universitário com o qual já estivesse familiarizada.

essas capas que os estudantes usam são, na verdade, parte do traje acadêmico, uma vestimenta tradicional em todo país. para os homens, calça preta e camisa branca sociais, colete, terno, gravata e capa. para as mulheres, a calça é substituída por uma saia, e estou quase certa de que não há o colete. cada universidade possui detalhes específicos no seu traje, mas o resultado final é bem parecido.

o traje acadêmico não é para todos. só podem usá-lo os que estão no último ano do curso – os nossos conhecidos veteranos, que aqui se autodenominam “doutores”. e há mais: o uso da roupa só é legitimado para aqueles que, em seu primeiro ano, se submeteram aos rituais de “praxe”.

de cara, eu traduzi “praxe” como “trote”. mas foi só os caloiros começarem a circular diariamente pela cidade portando um chapéu de burro e plaquinhas de identificação, que eu entendi que o buraco era bem mais embaixo. aqui em coimbra, não tem dessa de ser pintado ou sujado impiedosamente por algumas horas para depois ir pedir alguns trocados no sinal. pode até ter isso tudo, mas tem mais – muito mais – e durante meses. os que estão familiarizados com a vida universitária de ouro preto talvez não se assustem tanto com a praxe. mas, até para esses, eu ainda arrisco que essa prática tem proporções maiores que a adotada pelos estudantes da ufop.

desde o dia 20 de setembro, início das aulas para o 1º ano do 1º ciclo, eu já vi de tudo nesta cidade: pessoas fazendo infinitas flexões ao sol; grupos imensos de estudantes se amontoando dentro de um ônibus, uns em cima dos outros, e cantando versos recheados de palavrões; garotos subindo em tempo recorde os 125 degraus das escadas monumentais que dão acesso ao principal pólo da universidade; garotas almoçando com dizeres em suas camisas que indicavam a que “estrebaria” pertenciam; caloiro correndo pelado pela principal praça da cidade, à procura de suas roupas.

e tudo isso, que me pareceu extremamente inaceitável e humilhante, sendo feito sempre de bom grado por todos eles. você não vê desgosto nos rostos dos caloiros que estão passando por tudo isso. aliás, é bem provável que consiga flagrar sorrisos a estampar fiel empolgação. porque, como eu disse anteriormente, a tradição diz que só merecem usar os trajes acadêmicos aqueles que passam pela praxe, que fazem por merecer. você não é obrigado a ser praxado. mas, se resolver portar a capa dois anos depois, não será reconhecido como um dos doutores.

e o orgulho de portar tais vestes é tão grande, que os estudantes não restringem seu uso apenas às ocasiões acadêmicas: é muito comum que você os veja vestidos assim passeando pelo shopping, vendo um filme no cinema, ou até mesmo dançando numa boate.

considerando o fato de que os cursos aqui só duram três anos, o que faz com que eu seja provavelmente mais velha (e mais veterana) que grande parte dos veteranos, é claro que me recuso a referir-me a eles como “doutores”. a solução? um apelido carinhoso que meus amigos e eu adotamos logo que vimos os primeiros exemplares trajando capa por aí: para nós, eles são todos harry potters.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

sempre boas novas

essa na foto comigo é a helena! :)


semana que vem, completo dois meses longe do brasil. semana que vem, o hiato de notícias que surgiu por aqui também faria aniversário. já aceitando o fato de que a minha ideia inicial de relatar tudo o que tenho vivido neste blog foi para o ralo, não quero, porém, que deixe de constar cá um pouco do que tem sido minha vida portuguesa.

não menos que perfeita, eu diria, e com muita verdade. mas eu não saberia dizer o que mais a faz ser assim: as aulas, as pessoas, os eventos, a cidade... certeza de que é a reunião de tudo isso.

semana passada, enquanto bebíamos entre amigos, um deles, o vicente, soltou essa: “eu tô gostando de coimbra. mas, se tem alguém que goooosta de estar aqui, é a marcela”. e eu realmente acho que sou a maior entusiasta dessa jovem senhora de mais de mil anos que sabe tão bem me inspirar excessos. aqui, bebe-se muito, come-se muito, sai-se muito, dorme-se muito e (juro!) estuda-se muito, no meu caso.

eu estou cursando apenas três disciplinas: literatura brasileira 2, literatura portuguesa 2, e cultura portuguesa 1. e sinto-me cursando no mínimo seis. a carga de leitura é tanta, que eu tenho a ligeira impressão de que voltarei daqui com uma pilha de xerox quase tão grande quanto a que construí ao longo dos meus sete períodos na ufmg. e que não entendam essa declaração como reclamação! tenho gostado muito de todos os textos, e mais ainda de como eles são trabalhados em aula – principalmente nas duas disciplinas portuguesas, já que a brasileira só começou de fato esta semana. encanto-me com cada nova descoberta sobre a história e cultura desse país, e reapaixono-me por toda a literatura que já havia passado por mim no brasil, mas que sabe bem apresentar-se como nova a cada releitura.

em quatro semanas de aula, sinto finalmente o que andei buscando por quase quatro anos de curso: a sensação de que estou no lugar certo, fazendo o que realmente gosto. tenho agora planos e expectativas num curso pelo qual, já há bastante tempo, havia resolvido apenas passar sem extraordinários feitos.

e, como nada em coimbra é o bastante, também ando descobrindo uma nova paixão: radiodifusão. estou participando da produção de um programa que entrará na grade de horários da rádio da universidade, a “ruc”, daqui a mais ou menos duas semanas. isso graças ao douglas, que cedeu sua vaga para mim, achando que pudesse ter a ver comigo – e acertou em cheio! o nome do programa será “babel”, terá a duração de uma hora por semana, e tem como público alvo os intercambistas da universidade. nele, apresentaremos um pouco da cultura dos diversos países de onde vêm os estudantes que cá estão neste semestre, além de oferecer dicas úteis para que esse período seja aproveitado ao máximo. semana passada, passamos por um treinamento técnico e, a partir da terça, começamos discutir e produzir o material que será veiculado nos dois primeiros programas. estou responsável, a princípio, pelos blocos de gastronomia e agenda cultural. também estou produzindo uma matéria sobre a “latada”, festa universitária que acontecerá do dia 21 ao dia 27 deste mês. o resultado vocês poderão conferir aqui. detalhes sobre dia e hora, conto posteriormente!

quanto ao resto, posso dizer que nenhum dia aqui é igual ao outro, de modo que “rotina” e “tédio” são palavras que não andam saindo da minha boca, ou rondando meus pensamentos. inverto tudo, dançando loucamente durante a semana e fazendo do sábado o dia da preguiça. subverto tudo, cozinhando coisas elaboradas só para mim às 4 da manhã e fazendo faxina às 10 da noite.

não consigo me lembrar de um tempo em que fui tão plenamente feliz. estou seriamente gripada desde ontem e, ainda que eu esteja tossindo insuportavelmente e só consiga respirar com a ajuda de um descongestionante nasal, esse sentimento bom não sai de mim.

quero mais coimbra. muito mais. e esta cidade realmente parece muito apta a continuar alimentando minha insaciabilidade.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

instituto de estudos brasileiros

uma ampla sala forrada por livros até o teto em três das quatro paredes. no centro dela, uma mesa bastante comprida, bem talhada e feita de madeira nobre, rodeada por cadeiras de igual material, e encabeçada por um quase trono imponente.

parece uma biblioteca, ou uma sala de reunião para gente bem importante. mas foi a sala da primeira aula que tive aqui em coimbra. e, não, não é apenas um espaço provisório. o instituto de estudos brasileiros, que é o nome que este lugar recebe, é o abrigo das pouco valorizadas matérias sobre cultura e literatura brasileira. tão pouco valorizadas, que minha turma tem quatro alunos inscritos. quatro!

azar dos que não se inscreveram. minha professora é brasileira, carioca, e me causou uma primeira impressão bem positiva. mas só começará suas aulas efetivamente dia 4 de outubro. depois eu digo que até quero estudar, mas não consigo, e vocês não acreditam...

domingo, 12 de setembro de 2010

das minhas novas paixões


e então, como eu disse no post anterior, os ares começaram a mudar positivamente em coimbra na quarta-feira. o que eu não sabia é que tudo podia ficar ainda melhor, muito melhor, e numa velocidade assustadora.

hoje é domingo e, quatro dias depois de ter saído do meu casulo localizado aqui na avenida fernando namora, eu posso declarar com absoluta certeza de que estou completamente apaixonada. e, dessa vez, não apenas pelas ruelas, comidas ou noitadas dessa cidade. mas por pessoas que a habitam.

é engraçada a proporção que as coisas tomam quando tudo o que lhe é familiar e caro não te está às mãos e novos momentos e experiências tornam-se quase uma exigência para se seguir em frente. todo contato com novos seres é sentido de forma muito mais intensa, para o bem o para o mal. para minha sorte, o que anda à flor da pele são maravilhosos sentimentos.

porque tenho sentido esse contato do lado de cá com tal intensidade, hoje senti necessidade de apresentar a vocês aqueles que, entre uma praia de mentirinha e uma de verdade, muitas bebidas, entrega aos hits brasileiros mais duvidosos e muitas boas gargalhadas, eu realmente já sinto que poderei chamar de amigos.

eles são todos brasileiros. e, contrariando toda a expectativa que se tem no intercâmbio de afastar-se o máximo possível do que te remete à já familiar cultura e aproximar-se de rostos e línguas diferentes, encontro neles personalidades que vencem essa intenção de imediato, sem grandes esforços.

eu não me lembro de outra ocasião na minha vida em que eu gostei de cara de tantas pessoas ao mesmo tempo, sem uma ressalva sequer. todos são muito lindos. não só no clichê de possuírem um interior valioso. eu os acho tão bonitos esteticamente, também, que não me canso de clicá-los a todo momento e ficar fielmente admirada pelo resultado dessas fotos. os rapazes são todos encantadores, igualmente possuidores do dom de te entreter numa conversa pelo tempo que for e de instigar constantemente a vontade da proximidade. as meninas, todas incrivelmente doces, promovem a mulher brasileira de apenas atraente a apaixonante. têm os sorrisos mais lindos, daqueles que te trazem um calorzinho instantâneo dentro da alma.

não bastassem eles se encaixarem perfeitamente nos perfis que deixo aqui – sem vestígio algum de exagero – ainda carregam consigo a disposição desprendida que eu trouxe para coimbra e esperava também encontrar aqui para experimentar tudo o que portugal e o intercâmbio têm a oferecer.

eu já tenho saudade de cada gostoso minuto que passo ao lado dessas pessoas e ando desejando fortemente que muitos momentos memoráveis em suas companhias ainda estejam reservados a mim.

sabem de uma coisa? é muito verdade o que dizem sobre coimbra ser a cidade do amor.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

os altos e baixos da primeira semana de efetivo intercâmbio

o ruim de deixar de postar aqui com uma regularidade boa é que as histórias vão se acumulando e eu, que já sou notavelmente verborrágica, acabo tendo milhares de caracteres para entreter os mais dispostos a saber como anda minha vida portuguesa.

domingo passado, completaram-se 20 dias que já estava aqui em portugal. isso significou que era a hora de deixar minha mãe no aeroporto e seguir sozinha a partir daí. durante o tempo em que passamos quase que integralmente juntas, os pontos positivos de ter a companhia dela são inúmeros. e há apenas um ponto negativo, que é, porém, muito cruel: mais uma despedida.

não foi fácil dizer tchau para a minha mãe. primeiro porque a confusão do aeroporto incrivelmente lotado de lisboa não te permite privacidade para chorar ou a oportunidade de se demorar num último abraço antes do embarque; segundo, porque assim que acenei a mão pela última vez para ela, o peso da bagagem que tinha para empurrar parece ter se transportado instantaneamente para os meus ombros.

agora sim, era o intercâmbio na sua definição mais exata. e, muito entretida nos meus passeios, eu percebi que esqueci por dias que eu não estava apenas passeando, mas começando a morar do outro lado mundo.

a adrenalina que esse pensamento me trouxe secou rapidamente as lágrimas do meu rosto e me puseram atenta ao procedimento que eu deveria tomar para voltar pra a minha casa. e tudo correu bem, de forma que, em menos de 20 minutos, eu já estava dentro de um ônibus para coimbra. enquanto eu esperava pela sua partida, uma garota mais ou menos da minha idade carregada de muitas malas entrou sozinha no ônibus, também, e se sentou na poltrona na minha frente. pela janela, eu vi a sua mãe se despedindo, sorrindo calmamente. não havia lágrimas nos olhos de nenhuma das duas. nos meus, no entanto, as lágrimas voltaram a correr livremente, num misto de tristeza e inveja. eu saquei na hora que a garota era portuguesa e, ao contrário de mim, teria seu refúgio familiar quando quisesse a apenas duas horas do seu novo destino.

depois disso, não chorei mais. mas uma apatia que eu não havia sentido desde então se abateu sobre mim. e se prolongou pela segunda-feira nublada que casou perfeitamente com as minhas frustrações pela burocracia imposta pela faculdade e pelas pessoas pouco amigáveis que eu conheci enquanto tentava resolvê-las – sem sucesso.
ainda na segunda, achei que seria uma boa distração fazer compras para a casa. e realmente foi. até a hora em que eu saí do shopping carregada com uma sacola de compras com muitos desumanos quilos e fui pega pela chuva.

a terça-feira se seguiu com os insucessos burocráticos e a minha apatia se converteu no mais legítimo tédio, que acabou gerando revolta. então eu estava transformando os primeiros dias do que deveria ser a melhor experiência da minha vida em ócio improdutivo? não ia rolar de continuar assim. e, como que adivinhando a minha frustração, uma mensagem chegou no meu celular, mudando toda a perspectiva da semana. era um convite para a primeira festa do semestre promovida pelo erasmus, que aconteceria no dia seguinte (ontem, no caso).

pronto. festa. música. gente. álcool. as quatro palavras mágicas que levantaram o meu astral instantaneamente e transformaram o resto da terça e boa parte da quarta num revival de um dos raros capítulos felizes da minha adolescência: eu me sentia como nas vésperas das primeiras festas de 15 anos a que eu fui. ansiosa, experimentando todas as minhas roupas pretas – e a cor do traje era uma exigência da festa – para finalmente decidir que eu precisava de uma saia nova para a ocasião. eu decidi que ia de qualquer jeito, mesmo não conhecendo quase ninguém na cidade. mas, temendo que minha coragem fosse enfraquecida ao longo do dia e eu terminasse a noite trancada mais uma vez no meu quarto, assistindo a filmes até de madrugada, acabei indo atrás de conhecidos para me acompanhar. e eles foram: a bella, que faz ciências sociais na ufmg e é colega dos meus queridos futuros antropólogos, e o douglas, que também faz letras e foi selecionado para o programa de intercâmbio comigo.

eu pretendia contar com detalhes como se passou a noite, mas decidi que, posteriormente, dedicarei um post à noite de coimbra – e, para tal, irei atrás de mais experiência sobre esta.
por isso, só o que eu quero dizer desta noite é que ela não decepcionou de jeito nenhum a minha expectativa investida nela. da meia-noite às seis da manhã, eu conheci pessoas maravilhosas, desbravei dois bares e uma boate (e abri mão de uma segunda quando o dia quase já raiava), descobri uma promissora amizade, experimentei bebidas fantásticas a preços inacreditavelmente baixos (espumante de latinha a 3 euros é só sensacional), me diverti em contato com as mais diversas culturas e os mais bizarros comportamentos que surgem da mistura entre a bebida e o que não nos é usual.

eu não me olhei muito no espelho hoje, mas eu duvido que tenha deixado de sorrir desde que acordei. e, só pra me provar mais uma vez que as coisas boas sempre são atraídas pelo bom humor, eu finalmente venci boa parte da minha burocracia hoje.

agora, sim, eu estou realmente dentro do intercâmbio. e com um ótimo pressentimento de que, de fato, ele será a melhor experiência da minha vida. :)

obs: para os que estranharam a falta de relatos sobre as minhas aulas, bem... isso é só porque eu AINDA estou de férias. ô, vida difícil...

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

ah, lisboa... ah, pessoa...

"e, se o escritório da rua dos douradores representa para mim a vida, este meu segundo andar, onde moro, na mesma rua dos douradores, representa para mim a arte. sim, a arte, que mora na mesma rua que a vida, porém num lugar diferente, a arte que alivia da vida sem aliviar de viver, que é tão monótona como a mesma vida, mas só em lugar diferente. sim, esta rua dos douradores compreende para mim todo o sentido das coisas, a solução de todos os enigmas, salvo o existirem enigmas, que é o que não pode ter solução."


"tudo me interessa e nada me prende. atendo a tudo sonhando sempre; fixo os mínimos gestos faciais de com quem falo, recolho as entoações milimétricas dos seus dizeres expressos; mas ao ouvi-lo, não o escuto, estou pensando noutra coisa, e o que menos colhi da conversa foi a noção do que nela se disse, da minha parte ou da parte de com quem falei. assim, muitas vezes, repito a alguém o que já lhe repeti, pergunto-lhe de novo aquilo a que ele já me respondeu; mas posso descrever, em quatro palavras fotográficas, o semblante muscular com que ele disse o que me não lembra, ou a inclinação de ouvir com os olhos com que recebeu a narrativa que me não recordava ter-lhe feito. sou dois, e ambos têm a distância - irmãos siameses que não estão pegados."

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

o pesadelo europeu

eu sempre adorei pombos de rua. não que os achasse criaturas bonitas, porque essa coloração cinza que quase se confunde com o asfalto não ajuda. mas, na escola em que estudei durante todo o meu ensino fundamental, os pombos encontravam-se aos montes pelo pátio, e eu adorava correr atrás deles e vê-los aprontar uma corridinha de início, depois levantarem vôo desabalados. notem que eu não disse que gostava de fazer isso “quando menina”. vergonhoso admitir que aproveitei desse passatempo até meados da minha adolescência.

enfim, o caso é que sempre adorei pombos. até conhecer os pombos europeus. os pombos europeus não aprontam corridinhas e levantam vôo quando você se põe no caminho deles. eles são os donos das praças e ruas mais largas, e quem deve sair de suas vistas é você. caso essa regra não seja obedecida, sabe o que acontece? elas levantam vôo e vão não na sua direção oposta, mas ao seu encontro, e a probabilidade de levar uma “pombada” na cara torna-se arriscadamente alta. eles são destemidos e arrogantes, além de se portarem como ladrõezinhos alados. comer em cafés abertos nas praças em que eles imperam é sempre arriscado: se você não vigia atentamente seu prato, eles acabam pousando dentro deles e se apossando da sua comida. vi esta cena anteontem, em coimbra.

quando estive em veneza, presenciei uma das cenas mais cômicas e bizarras da minha vida: pessoas colocavam pães nas palmas das mãos e as voltavam para cima com os braços abertos, para que os pombos pousassem ao longo de seus corpos e eles pudessem tirar fotos... divertidas? o problema é que eles nunca vinham em pares ou trios. vinham em montes descontrolados que acabavam atacando os pobres turistas, mais ou menos como aquela cena do final de “esqueceram de mim 2”, sabem?

eu odeio os pombos europeus. eu tenho medo de pombos europeus. e ontem cheguei aqui em porto, onde eles estão por toda parte, principalmente ao pé dos monumentos com os quais você mais quer tirar foto. resultado? fui eu tirar foto junto ao paço do conselho e sofri um atentado em forma de revoada. e eis a bonita foto que obtive:



seis longos meses convivendo com essas criaturazinhas impertinentes e amedrontadoras. desta vez escapei, mas tenho o forte sentimento de que acabarei levando uma pomba. é...

terça-feira, 24 de agosto de 2010

fátima

hoje, mamãe e eu fomos a fátima. havíamos combinado este passeio para ontem, mas ainda não sei mexer bem no celular modernoso que arrumei por aqui, de forma que o despertador não tocou, e perdemos o trem das dez, das onze... descoberto como fazer para acordar na hora certa, fomos nós em busca da estação de comboio, que não era nenhuma das duas que eu havia circulado no mapa, mas uma que havia quase fora da cidade, onde chegamos em cima da hora, mas ainda em tempo de pegar o comboio no horário desejado.

tanto esforço para uma furada! a estação da cidade fica, na verdade, a 24km desta! oi? fátima é, na verdade, um distrito de ourém, município que se tem que atravessar por inteiro para lá chegar. me pergunto, então, por que a estação não se chama estação de ourém, e não avisam isso aos turistas.

a nossa sorte foi que, pelo visto, não somos as únicas desavisadas que ali descem e ficam perdidas no meio do nada, e há táxis na saída da estação que, a um preço bem razoável, te deixam no centro de fátima. fomos no carro de um senhor já de idade mais avançada que pouco ouve, mas muito fala, muito interessado em nos mostrar os pontos importantes de ourém – que, no fim das contas, não tem muita coisa importante.

chegar ao santuário de fátima foi uma surpresa grande para a minha mãe, quase um susto! pensava ela que encontraria uma modesta capela erguida junto ao lugar em que nossa senhora apareceu aos três videntes durante seis meses (como meu post anterior já foi dedicado a uma história da cultura portuguesa, não vou contar outra hoje. se você não conhece esta, leia aqui). mas o lugar é o maior complexo arquitetônico da igreja católica em que eu já estive, e posso me arriscar a dizer que só perde para o vaticano.

se tem uma coisa que já vi na vida foi igreja. elas são bem numerosas em minas, e cá na europa não é diferente. construídas nas mais variadas épocas, mas em sua maioria datando de mais de dois séculos atrás, não faltam turistas com seus flashes – curiosamente permitidos aqui em boa parte delas – clicando todo os anjos, santos, órgãos e painéis exuberantes que se podem encontrar em quase todas.

quase todas, porque a basílica e as capelas que compõem o santuário de fátima não são assim. talvez por serem bem novas, impressionam pelo tamanho, mas são bastante simples em ornamentações, tanto por dentro quanto por fora.

e ali, naquelas igrejas que podem ser consideradas até simplórias, se comparadas a todas as outras, eu vi, pela primeira vez, poucos turistas e muitos devotos. são pessoas de toda parte do mundo, mas que ali não estão para apreciar bonitos entalhes ou pinceladas, mas para adorar os túmulos de jacinta, lúcia, francisco, e a imagem de nossa senhora do rosário.

dentro da basílica, muitos formam fila para chegar perto das lápides. do lado de fora, à direita, uma capela sem paredes reúne uma pequena multidão a rezar o terço, enquanto muitos atiram velas a grandes piras.

e, no centro do santuário, o que mais me prendeu a atenção durante todo o dia: pessoas de joelhos, atravessando a imensa extensão de uma ponta à outra, num ato de cumprimento de promessa, ou simplesmente penitência.

é de comover qualquer um. sente-se admiração, espanto, estranhamento, dor solidária, ou qualquer outro tipo de coisa, mas imune à cena é que não se passa.

fui batizada, fiz primeira comunhão, mas não freqüento a igreja desde então, e não me considero católica. sou das que entra nesses santuários seculares daqui à procura de monumentos que me encham os olhos, sem tocar de verdade na alma. mas hoje admirei muito a fé daqueles que ali estavam, de fato, em busca do mais legítimo culto ao que de verdade se adora.

eu ia até comentar sobre o quanto se lucra ao redor do santuário com a venda dos mais diversos artigos ditos religiosos, mas não ouso. o post de hoje é só uma nota de respeito.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

porque inês é morta



tu, só tu, puro amor, com força crua,
que os corações humanos tanto obriga,
deste causa à molesta morte sua,
como se fora pérfida inimiga.
se dizem, fero Amor, que a sede tua
nem com lágrimas tristes se mitiga,
é porque queres, áspero e tirano,
tuas aras banhar em sangue humano."
(camões - os lusíadas, canto III, 119)







inês de castro era a mais bela aia de dona constança de manuel, senhora do infante d. pedro de portugal. filha daqueles a quem o rei tinha em alta conta, nada lhe faltava em refinamento em ares de nobreza, a não ser um título que assim a legitimasse. não que tal fato tivesse contado a d. pedro, que logo se encontrou irremediavelmente encantado pela moça.

sendo impossível evitar que a paixão fosse consumada, toda corte logo pôs-se a comentar do infame adultério que comprometia gravemente as relações diplomáticas portuguesas com joão manuel de castela, pai de d. constaça. apoiado pelos irmãos de inês, que tampouco aprovavam o romance escandaloso, el rei, d. afonso IV logo arrumou de exilar a bela dama de companhia junto à fronteira castelhana, no castelo de albuquerque. de nada adiantou. inês e pedro, dizem os escritos, continuavam a corresponder-se e a alimentar o amor, mesmo que à distância.

nem bem correu um ano do afastamento de ambos, d. constaça veio a falecer no momento em que deu a luz ao futuro rei de portugal. então viúvo, pedro ordenou que inês regressasse e viesse morar consigo em sua casa. estava escancarado o escândalo que tanto se quis abafar, e inúteis eram as tentativas de d. afonso de tentar casar seu filho novamente com uma senhorita nobre, ao passo que herdeiros bastardos do amor de pedro e inês começavam a nascer.

confusões diplomáticas de ordem real começaram a estourar aos montes. corria o boato de que pedro e inês haviam se casado às escondidas.

farto de tantas tentativas de separar os amantes, d. afonso decide dar fim à vida de inês. para tal, aproveita uma excursão de caça promovida pelo filho e, na sua ausência, ordena que três homens a embosquem no paço de santa clara, onde inês vivia àquela altura.

o sangue de inês é derramado no mondego, fazendo nascer a fonte dos amores, onde até hoje crescem algas avermelhadas a lembrar o brutal assassinato.

d. pedro mal pode suportar a dor e a revolta pela armadilha tramada pelo próprio pai. tão logo se torna rei, vai em busca dos três carrascos de inês e, capturado dois, manda que lhes sejam arrancados os corações: um pelo peito, outro pelas costas. dona inês é condecorada como sua rainha eterna, mesmo depois de morta, à qual todos tiveram de prestar homenagens.

desde a morte do rei e até hoje, inês e pedro jazem em dois túmulos, um de frente ao outro, para que "possam olhar-se nos olhos quando despertarem no dia do juízo final".


eis a história, tal qual aprendi, daquela que foi rainha depois de morta.

domingo, 22 de agosto de 2010

pausa para o pipi

hoje vai um post pequeno, pra variar o tamanho dos textos que tenho escrito por aqui, mas não variar a fama que o domingo tem de ser um dia em que poucas coisas acontecem - o que não mudou muito por aqui.

a ressaca pela semana de procura de quartos e arrumação do finalmente achado foi tanta, que mamãe e eu não nos sentimos realmente dispostas a visitar a fonte dos amores hoje, último ponto turístico da minha lista de locais a ver antes de passar de turista a realmente moradora de coimbra. para que o dia não fosse um ócio completo, decidimos ir ao cinema do dolce vita - meu shopping vizinho - agora à noite.

por que este fato merece um post?

1) porque os ingressos são vendidos com lugares marcados;
2) porque o combo médio de pipoca e refrigerante é o suficiente para que duas pessoas se fartem de comer até o fim do filme, em vez de se deliciarem apenas durante o trailer;
3) e porque aqui as sessões possuem um intervalo de cerca de 5 minutos mais ou menos na metade do filme para que as pessoas possam ir ao banheiro!

e você achava que os portugueses não sabiam das coisas, hein... ;D


obs: ah! o filme era "cartas para julieta"! e eu penso que já saiu dos cinemas brasileiros há algum tempo, não? que bom que tive uma segunda chance de vê-lo!

sábado, 21 de agosto de 2010

“home is where the heart is”… and where you can live decently

desde o início dos meus preparativos para o intercâmbio, achei que arrumar um canto para morar aqui seria uma das partes mais fáceis. afinal, coimbra gira em torno da universidade, de modo que é de se esperar que não faltem oferta de moradias a estudantes. e, de fato, elas são muitas. só que nem sempre estão, de fato, hum... habitáveis.

durante três dias, dediquei quase todas as horas fora do hotel à procura por um quarto para menina que possuísse um banheiro privado. essa condição – fundamental, para mim – diminuiu bastante as minhas opções. mas também andei vendo alguns quartos com banheiros partilhados e posso dizer que não é apenas essa exigência que dificulta a coisas. eu, que não quis reservar nenhuma moradia enquanto ainda no brasil, apenas pela internet, constato agora que fiz uma sábia escolha. as possibilidades de se cair numa roubada grande são consideráveis: lugares muito sujos, quartos em sótão em que o teto não te permite ficar totalmente em pé, janelas minúsculos que apenas têm um propósito de trazer a mínima quantidade de ar fresco necessária para o recinto...

em coimbra, os proprietários dos quartos oferecidos quase nunca habitam o mesmo lugar. por isso, é sempre necessário ligar e agendar uma visita. nesses agendamentos e visitas, algumas situações merecem registro aqui:

caso 1: dona rosa - a velhinha mais fixe

“fixe”, aqui, é como se chama algo ou alguém legal, descolado. e é exatamente o que dona rosa é. sua pensão fica no largo da sé velha, ponto turístico famoso e bem perto do pólo I da universidade. ao lado da pensão, fica o bar também pertencente a ela, contendo as mais diversas bebidas, todas dispostas a derrubar os estudantes mais resistentes. dona rosa deve ter pra lá dos 70 anos. parece aquelas avós que mimam os netos até não poder mais. nada de incomum em sua imagem, a não ser o fato de que dona rosa tem uma tatuagem. sim, senhores! uma borboleta gravada no antebraço, a impressionar aqueles que, como eu, sempre pensam que tatuagem é algo que só se tem até os 40 anos (e eu me pergunto o que acharei de mim mesma quando for uma velhinha tatuada). mas dona rosa é tão fixe e tão popular por aqui, que já não tinha mais quartos disponíveis para me abrigar, de modo que o meu contato com essa fixe senhora será apenas pelas mesas do seu bar.

caso 2: google maps way of life

se explicasse em palavras, não ia ficar tão claro o quão absurda foi essa situação. então, resolvi ilustrar:

ligamos para esta moça, que mora na casa onde o quarto é oferecido, e dissemos a ela que estávamos na praça da república, assinalada em vermelho. a menina não queria dar-nos o endereço, disse que era mais fácil explicar como se chegava ao lugar. o lugar ficava neste ponto indicado em verde:

o caminho que ela nos mandou fazer – e que de fato fizemos, por não conhecermos nada ainda – foi este:

depois de muito andar, chegamos à tal rua, cheia de casas muito simpáticas, à exceção de uma muito antiga e descuidada, quase em ruínas. adivinhem qual era a casa da moça... minha mãe nem quis entrar.


caso 3: senhor... oi?

hoje, fomos conhecer o quarto oferecido pelo miguel, um senhor que parece ter aprendido o mínimo da dicção oral apenas porque se comunicar é uma convenção social necessária. não é que ele fale exatamente pouco, mas não se entende uma palavra! japoneses aprendendo a falar português se fariam entender melhor que este homem, para quem tivemos que ligar cerca de 5 vezes, nas quais revezávamos ao telefone minha mãe e eu, na esperança de captar expressões que nos levassem próximo ao lugar cujo endereço ele também insistia em não passar, acreditando ser mais fácil explicar-nos como chegar lá. de fato, era bem fácil, mas a dificuldade de comunicação fez com que ele tivesse que nos procurar até onde conseguimos chegar com o que entendemos.

um alívio quando alguém num carro azul marinho nos buzinou, acenando do lado oposto da esquina! atravessamos, prontas para entrarmos no carro e seguirmos até o apartamento, quando ele soltou: “podem seguir em frente mais 200 metros, que já avistarão o lugar”. arrancou o carro, e foi. oi? não era nem questão de cortesia. era também, mas muito mais de praticidade: afinal, não estávamos indo para o mesmo lugar?

só para constar: ao vivo, também não entendíamos muito das palavras dele. nada de culpar a telefonia portugesa....

caso 4: o MEU quarto!

quem combinou a visita comigo hoje foi a proprietária, dona olinda. mas, ao chegarmos no local combinado, estava lá também a sua filha, aldina, professora do curso de letras que já esteve em belo horizonte em 2000 para um congresso sobre guimarães rosa. tendo descoberto isso com cinco minutos de conversa e ainda a caminho do apartamento, eu já sabia que estava indo conhecer minha futura casa.
e, ao chegar no apartamento, a conversa com aldina nem precisou servir de argumento à minha decisão. um lugar espaçoso, com o jeitinho aconchegante que todo lar de verdade precisa ter. o quarto oferecido é grande, com uma bonita vista (localiza-se no quinto e último andar do prédio) e bons móveis.

aqui moram uma portguesa, uma brasileira e uma timorense. até agora, só conheci a portuguesa, margarida, um ano mais nova que eu, e uma graça de pessoa!

depois de três dias de bastante estresse e furadas, apresento a vocês a fachada do que será minha casa pelos próximos seis meses:


fica um pouco longe da universidade, mas há um ponto de ônibus logo em frente. estou a 5 minutos a pé do dolce vita, um shopping bem bacana que já me conquistou por possuir uma franquia do kfc na praça de alimentação (os vegetarianos e saudáveis que me desculpem, mas frango frito no balde é fundamental). também estou bem ao lado do estádio da cidade, onde o u2 fará dois shows agora em outubro, que eu certamente escutarei na íntegra do meu quartinho. alguém quer uma transmissão ao vivo? ;D

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

coimbra!


oito horas e alguns minutos de vôo, duas refeições razoáveis, 3 filmes sem os quais eu poderia viver e nem uma hora de sono, e eis que... estamos em uma fila gigante para imigração!

já estive em portugal há dois anos atrás, como disse anteriormente aqui, e não tive que me postar atrás de tantos candidatos à entrada no país na vez anterior. mas era uma fila até rápida (passei uns 40 minutos nela e juro que não acho de todo ruim), com pessoas de todos os tipos.

eu tenho um medo enorme de entrevistas de imigração. por mais que tenha em mãos todos os documentos que comprovem que não estou entrando no país alheio para praticar atividades ilegais, sempre vi e ouvi tantas histórias de pessoas como eu deportadas no fantástico, que avisto o guichê pelo qual terei de passar e já começo a suar frio. também não ajuda muito se algumas pessoas na sua frente começam a ser encaminhadas para as temidas salas especiais para quem não convence sobre as suas intenções de imigração.

mas, dessa vez, correu tudo mais que bem! um rapaz com um sorriso largo, que ao ouvir de mim que estava indo para coimbra fazer intercâmbio, respondeu com um “pois faz muito bem!”, e começou um papo sobre as atrações da cidade. sequer olhou para a cara da minha mãe, bastou que eu dissesse que ela me acompanharia nos primeiros dias, que o carimbo de entrada foi concedido no ato.
como as coisas não podem dar certo por inteiro, mamãe e eu esquecemos uma das malas na esteira, e passamos um mini sufoco para recuperá-la.

do aeroporto direto para a rodoviária. rodoviária MESMO. muito parecida com a de são joão del rei, pra quem já esteve lá. um pouco pior, talvez. mas foi a conta de tomarmos um lanche (chips com pepsi, porque nada preparado no local parecia muito confiável...) e apanharmos o “autocarro” para coimbra. posso dizer pouco da viagem que durou cerca de três horas, pois foi o primeiro momento desde o embarque em belo horizonte que consegui descansar bem.

chegando a outra rodoviária legítima, a primeira visão da minha nova cidade. e que visão! ao largo do rio mondego, duas épocas a conviverem harmoniosamente: em alguns pontos, as construções antigas da baixa se amontoando até o ponto mais alto, onde fica o principal pólo da universidade; em outros, as construções mais modernas e bem acabadas, pra não fazer feio diante de nenhuma cidade grande!

aliás, coimbra é uma cidade grande! desde segunda, tenho descoberto várias regiões extensas e diferentes entre si, e cheguei hoje até a indagar à minha mãe se a cidade não é maior que belo horizonte, ao que ela respondeu que não – mas eu ainda tenho cá minhas dúvidas!*

na parte baixa, tudo parece ter mais de 800 anos. construções lindas e cheias de histórias, muitas delas guardando a origem desse país. e, em meio a toda a história, está ela, no alto. a mais imponente, estendendo-se por várias ruas em prédios, museus, laboratórios, cantinas, bibliotecas. a universidade de coimbra é monstruosamente grande. sério! todo curso aqui lecionado merece muitos metros quadrados de atenção. nesta região de que falo é chamada de pólo I, e abriga cursos da área de saúde, das ciências exatas e biológicas (que eles chamam apenas de “ciências”), e ciências humanas. ainda há um pólo para os cursos de engenharia, e outro para os cursos das ciências econômicas, ambos localizados em regiões mais novas.

estudar aqui exige muita força de vontade e preparo físico. quando se pergunta a algum morador daqui como chegar à universidade, a resposta é sempre “vai subindo, sempre subindo”. e não é exagero. à procura de lugar para morar (pretendo escrever mais sobre essa saga quando ela finalmente estiver terminada), subi as ladeiras que levam à universidade pelo menos cinco vezes e hoje passei o dia com aquela dor de quem acabou de iniciar as atividades de musculação.

mas tudo vale a pena, e até o esforço físico exagerado para se locomover é curtido! tenho ao meu lado uma das melhores companhias (a outra seria papai, que faz falta o tempo todo!), e quase sempre estamos a rir das mais diversas situações – nos outros momentos, discutimos e nos estressamos por coisas geralmente banais.

a comida daqui é muito gostosa, coisa que não havia achado quando estive em lisboa! no primeiro dia, comemos um prato chamado “arroz de tamboril com gambas”, que é um arroz com consistência entre a canja e o risoto, com alguns pedaços de peixe, e camarões. ó ele aí:

peguei a foto na internet, mas o meu prato era bem parecido com este!

as pessoas também são muito simpáticas e solícitas. contrariando o estereótipo europeu, todos parecem estar sempre prontos para um bom papo, ou dispostos a te ajudar no que puderem.

no momento, a vida ainda ta um pouco difícil, porque achar um quarto nas condições que desejo parece quase impossível. tenho acordado cedo e voltado só ao fim da tarde (do que seria a nossa tarde, porque aqui agora são 7:38h e ainda está claríssimo).

mas já tenho a certeza de que tudo aqui será aproveitado ao máximo, e que será um prazer imenso morar em coimbra! :)

*acabei de olhar na Wikipédia: belo horizonte é pouca coisa maior que coimbra! ;D

domingo, 15 de agosto de 2010

15 de agosto: é hoje!

nada será como antes
(milton nascimento/ronaldo bastos)

eu já estou com o pé nessa estrada
qualquer dia a gente se vê
sei que nada será como antes amanhã

que notícias me dão dos amigos?
que notícias me dão de você?
sei que nada será como está, amanhã ou depois de amanhã
resistindo na boca da noite um gosto de sol

num domingo qualquer, qualquer hora
ventania em qualquer direção
sei que nada será como antes, amanhã

que notícias me dão dos amigos?
que notícias me dão de você?
sei que nada será como está, amanhã ou depois de amanhã
resistindo na boca da noite um gosto de sol

uma vibração que não sabe se dá no coração, no estômago, ou nos dois ao mesmo tempo. um misto de sensações que, normalmente adversas, se completam e se explicam: euforia, nostalgia, medo, alegria, ansiedade...

saudade já grande do que e de quem fica, mas um espírito muito livre para se abrir para o novo que muito promete.

enfim, chegou minha hora de andar e voar pra ver o mundo!
meu próximo post, escrevo da minha nova cidade.

até mais pra vocês! :)


quinta-feira, 12 de agosto de 2010

meu short listrado

tweet do dia 27 de julho: “quero arrumar minhas malas. tipo hoje. não é vontade de ir amanhã. é só ansiedade, mesmo...”

era bem verdade que eu já andava com vontade de ir separando e empacotando as minhas coisas. acho, aliás, que, desde esse dia, toda vez que encontrei algum amigo, comentei: “acho que vou começar a arrumar minhas malas amanhã”. mas, como uma procrastinadora legítima desde os tempos da segunda série, nem uma das maiores ansiedades que sinto já ter experimentado venceu o velho e caro hábito de deixar tudo para a última hora.

com a data da viagem se aproximando cada vez mais, eu comecei a considerar seriamente a possibilidade de só fazer minhas malas dia 14. mas eis que, esta noite, não me faltou apenas sono, mas também o que fazer, e eu resolvi abrir meu guarda-roupa e decidir que roupas levarei para viver em coimbra comigo.

você, companheiro procrastinador que me lê e me entende, há de concordar que o fato de não executar uma atividade não quer dizer que não dediquemos algum tempo a ruminar sobre ela. e, no meu caso, acho que já fiz as minhas malas em pensamentos pelo menos umas cinco vezes. e devo dizer que isso de nada me serviu hoje.

mês passado, achei este guia de itens básicos para uma mala de uma intercambista. o guia oferece dicas de uma mala para destinos quentes e outra para destinos frios. como ainda pegarei um mês de verão e só volto quase no fim do inverno, resolvi estudar as listas e fazer uma mescla das duas. o resultado? minha mala está a uma distância abismal dos conselhos dados pelo guia, com excesso de peças consideradas de pouca utilidade na rotina e falta de peças essenciais para o período de frio.

neste momento, tenho atrás de mim uma quantidade bem razoável de roupas e nenhuma idéia de por quanto tempo elas me serão úteis; muita variedade e cor em roupas tropicais e quase nenhuma criatividade em blusas quentinhas.

dentre todas essas peças, no entanto, tenho a certeza de que levo a que mais me faria falta no intercâmbio: um short listrado que a filha de um amigo do meu pai me deu quando eu tinha uns 14 anos e que, na época, já estava velho e gasto. hoje, ele é um pedaço surrado de pano desbotado e já costurado algumas vezes pela minha mãe e com uns dois ou três buraquinhos persistentes. a coisa é que esse bendito é a roupa mais confortável que eu tenho, e desde os meus 14 anos é minha roupa favorita de ficar em casa, só saindo do meu corpo para ir para a máquina de lavar, retornando logo em seguida.

já há algum tempo, minha mãe vem tentando me convencer a joga-lo fora, - porque nem para pano de chão o meu trapinho de vestir serve - coisa à qual venho resistindo bravamente. nas últimas semanas, o short andou meio sumido das minhas coisas e eu comecei a desconfiar seriamente de que o haviam levado de mim. hoje, noeentanto, durante o difícil exercício de tentar arrumar uma mala inteligentemente, ele apareceu entre algumas camisetas. decidi, então, que ele era O item básico da minha mala, e o que por ventura faltar quando eu estiver por lá, acabo dando um jeito.

na verdade, esse post é só porque eu tenho certeza de que, amanhã, quando a minha mãe acordar e for inspecionar o que eu escolhi, o short vai sofrer um severo veto. espero que essa pequena declaração de amor incondicional a convença de esse pequenino pedaço de pano é o pedaço de casa que levo pro outro lado do mundo.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

por que não "sacolar" na europa

ainda sobre comentários interessantes que surgem quando o papo sobre intercâmbio aparece, há pessoas que não desdenham o destino "portugal" porque lêem nele "europa". e aí, vem o comentário que acho bem engraçado: "que maravilha! vai poder comprar um monte de perfumes/ maquiagens/ roupas/ cds/ ipod/ câmera/ nootebook/ celular/ televisão/ geladeira/ cama bem baratos!".

acho esse comentário engraçado principalmente quando é o primeiro dito por alguém, porque as minhas motivações essenciais para viajar - seja para ouro preto ou para coimbra - são sempre da ordem sinestésica, de forma que meu dinheiro está primeiramente direcionado para as ocasiões em que eu tenha que pagar para ver, tocar ou comer algo que não me seria possível aqui em belo horizonte. claro que, satisfeitos tais desejos, as lojinhas de souvenirs, de artesanatos cada vez menos locais (e artesanais), ou mesmo roupas começam a ser bastante convidativas. no entanto, e talvez nem seja necessário dizer isso depois do último post, não estou indo para europa para um maravilhoso semestre de compras, mas em busca do mais delicioso período de experimentações e aquisições de ordem não material.

agora, o que definitivamente não é engraçado são aqueles que, não contentes em prever para mim uma falência pelo pecado do capital, começam a me pedir para aproveitar e comprar para eles as mais variadas coisas. e eu estava na dúvida se esse era um assunto pertinente para um post, mas decidi que merecia uma atenção quando meu tio pediu à minha mãe – que passará alguns dias comigo por lá – que lhe trouxesse um esfregão que ele usava quando morava no algarve, muito eficiente e barato, segundo ele. um esfregão!

rola um mito de que os produtos que podem ser adquiridos europa afora são muito mais baratos que aqui. mentirinha. às vezes eu pesquiso algumas coisas no amazon.com e, de fato, isso acontece nos estados unidos. mas não se repete na europa. o euro, neste momento, está cotado em 2 reais e 31 centavos. um frasco com 50ml do famoso chanel nº5, por exemplo, é vendido por cerca de 95 euros na frança. num site brasileiro, ele custa 247 reais. multiplique o valor francês por r$2,31. você ainda acha que faria um senhor negócio da china?

eu caí nessa quando estive em londres: comprei dois cds por £4,95, achando uma pechincha incrível. só que, como a moeda estava cotada em mais de 4 reais, foi como comprar dois cds em qualquer loja daqui. as coisas podem ser mais baratas se você ganha o seu salário em euros/libras. agora, se os valores do seu extrato vêm computados em r+cifrão, esqueça.

além disso, em valores absolutos (tirando-se o valor da moeda e considerando apenas o número na etiqueta), a maioria das coisas costuma ter mais ou menos o mesmo preço daqui, o que, para nós, as torna, na verdade, mais caras – como os sapatos mais legais, que não são vendidos por menos de 90 euros.

comparações de valores à parte, sempre achei de uma cara de pau e de um relaxamento sem tamanho pedir que as pessoas vão atrás dos seus sonhos de consumo enquanto elas poderiam passear. acho que a aceitação de um pedido de “encomenda” é proporcional ao seu grau de proximidade da pessoa e à pertinência do seu pedido. ou seja: se você for a minha mãe ou o meu pai, é ok pedir qualquer coisa. se você quer muito algo que dificilmente encontraria no brasil (como o berimbau de boca, um curioso instrumento que uma amiga minha encomendou a conhecidos que estiveram pelo velho mundo há um tempo atrás ), é ok, também – exceto se você quiser um esfregão.

portanto, você que vai à europa, evite aceitar esses pedidos. se te constrange muito a negação categórica deles (acredite, eu não tenho coragem de falar a metade do que acabei de escrever aqui com quem me encomenda algo), apenas sorria amarelo e minta que já aceitou muitos pedidos e que tem medo de ser barrado na alfândega. não só é eficaz, mas também real: ter toda a sua mala aberta, questionada e taxada por um policial não é nada agradável.

e você que conhece alguém que vai à europa por esse tempos, evite a embaraçosa situação da pergunta “aaaah, será que você pode trazer x pra mim?”. as possibilidades de, nesse caso, você acabar recebendo uma recordação de bons momentos de alguém sem nada ter pedido serão muito maiores. :)