sexta-feira, 29 de outubro de 2010

feijoada transmontana

em coimbra, universitário miserável só é também morto de fome se quiser. além de todos os produtos absurdamente baratos que você encontra nos supermercados, e do programa que te ensina a combiná-los inteligente e deliciosamente, a universidade oferece uma diversidade considerável de pratos a preços bem razoáveis: além dos bares que você encontra em todas as faculdades (o da letras sempre me lembra do da faculdade de economia da ufmg, em cardápio e preço), o complexo universitário possui – como eu acabei de verificar – 15 cantinas.

o que eles chamam de “cantina” por aqui é o nosso velho conhecido “bandejão”. minto: nosso, não, porque eu devo admitir que almocei no bandeco da ufmg apenas uma vez durante todo o meu curso, logo no meu primeiro mês de caloura. sempre tive uma preguiça absurda de atravessar meio campus debaixo do sol de meio-dia para comer uma refeição que, na única vez experimentada, parecia se avolumar cada vez mais quando já dentro do meu estômago.

mas, tendo que comer em euros, e nem sempre com paciência ou tempo para fazer as receitas que eu passo no caçarola (último merchandising, prometo!), ganhei bem mais disposição para conhecer o que as cantinas daqui tinham a oferecer.

e não me decepcionei! bom, não muito. a maioria delas oferece diariamente o prato social, que consiste em:

1 pão
+
uma tigela de sopa
+
um prato com uma das opções do dia (são duas ou três, geralmente)
+
uma garrafinha de água ou um copo de suco (de amarelo, igual ao do bandeco)
+
uma fruta, ou uma sobremesa (arroz doce ou leite creme.. recomendo ambos!)


o preço desse combinado é €2,40. por alguns cêntimos a mais, você pode trocar a sua água por um refrigerante, ou mesmo (sério!) uma cerveja, um vinho. também é possível variar nas sobremesas.

mas muitas das cantinas oferecem ainda outras opções para quem não aguenta comer a mesma coisa toda semana: na cantina amarela (que leva esse nome pela cor das mesas e cadeiras), há sempre uma ou duas opções de pratos vegetarianos, além de um quiosque que vende baguetes numa versão mais modesta do subway; na cantina azul (adivinhem...), fica também o “snack bar”, que serve os pratos mais elaborados e tradicionais da culinária portuguesa; no mesmo edifício da cantina azul, fica também a cantina de grelhados, em que você escolhe a carne que mais te apetece, e ela vem acompanhada de arroz, salada e batata frita; nunca estive na cantina do estádio municipal para saber se há lá algo de especial, mas sempre me dizem que a comida lá é mais gostosa.


e, por falar em arroz, devo dizer que a relação que desenvolvi com o arroz das cantinas da uc é um bocado estranha. os que me conhecem mais intimamente sabem que o arroz é o componente mais fundamental de todas as minhas refeições – chegando, por vezes, a ser o único. minha mãe pode confirmar isso com incontáveis histórias de situações em que ela se esmerou ao máximo para preparar algum saboroso e diferente prato para o almoço, e recebeu da minha parte comentários elogiosos apenas sobre o arroz.

o arroz da minha mãe sempre foi campeão: torrado e cozido na medida certa, branquinho, soltinho, com aquele gostinho especial de alho. e o arroz da minha mãe é o OPOSTO do arroz das cantinas da universidade, que consiste numa bolota levemente massuda de medida padrão e meio encardido, cozimento (a meu ver) incompleto e pouco tempero. o caso é que eu desenvolvi uma danada de uma relação de dependência com esse arroz da cantina! e nem adianta justificar que é conformismo diante da necessidade de ter o grão nas minhas refeições. isso porque, às vezes, eu consigo reproduzir em casa algumas cópias quase fiéis do arroz da mamãe, mas o como pensando no quanto o trocaria facilmente pelo das cantinas.

esse tipo de relação errada e doentia me fez estragar o almoço de ontem, persistindo no prato social de quinta-feira que vem acompanhado de arroz: a feijoada transmontana.

essa é a feijoada transmontana, tal como é servida nas cantinas:

foto do meu prato de ontem. não dá pra ver na foto, mas juro que o arroz é encardidinho!

eu me lembro da primeira vez em que a experimentei. estava na fila, esperando para ser servida, e acompanhada de vários brasileiros que, como eu, foram atraídos para lá pelo convidativo nome, que nos criava a expectativa de feijão preto, linguiça e paio. nos meus pensamentos mais ousados, eu ainda me permitia sonhar com uma farofa e com a imitação portuguesa bem digna da couve.

acho que vocês podem imaginar a cara de decepção de todos quando alcançamos um lugar em que já podíamos dar uma espiada no prato, que, no final, tinha uma inclinação muito maior para se passar por dobradinha. um dos garotos que estava comigo, nesse momento, aproveitou que estávamos na cantina amarela e decidiu que era uma boa hora de tentar ser vegetariano, fugindo rapidamente para outra fila. os outros e eu resolvemos encarar.

não rolou. pelo menos para o meu paladar, a feijoada transmontana é um erro, seja como feijoada, como dobradinha, ou como “feijão com tranqueiras”. mas o prato foi, pelo menos, a sensação daquele dia. ao fim do almoço, nos intervalos da aula, pelos corredores da ruc, eu ouvi pelo menos cinco vezes uma conversa bem semelhante:

_e aquela feijoada, hein?
_feijoada? com repolho? hahahahahaha, tá bom!
_não tinha carne, só gordura!
_faltava sal!
_feijão duro, po...
_e o que era aquele mato não identificado ali no meio?

percebi o quanto pegar um nome emprestado da cultura do alheio pode ofender seriamente esse alheio. penso que seria como oferecer ao português um bacalhau com natas feito com peroá e que levasse batatas doces no lugar das inglesas.

mas eis que, ontem, entre o bacalhau à gomes de sá, que só vinha acompanhado de salada, e do feijão usurpador que me prometia um montinho do duvidoso arroz que caiu nas minhas graças, acabei me forçando a acreditar que, dessa vez, por estar na cantina azul e não na amarela, poderia experimentar alguma melhora no prato.

nenhum sucesso. e já deu de feijoada transmontana pra mim. não importa o que digam, não como nem a da cantina do estádio.

7 comentários:

  1. Hahahahahha... Não adianta levar o nome, tem que dizer do que é feito!!!
    Pensa pelo lado positivo, vai ser difícil acreditar em qualquer 'brigadeiro perfeito da mamae' que aparecer por aí. ;D

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  2. Esse é um dos pratos mais FEIOS que já vi!

    Mas confesso que adorei o nome TRANSMONTANA. Vou botar na minha filha!

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  3. Nossa filha, que desastre de comidinha hein! Adorei os elogios ao meu arroz e saiba que sempre o fiz com muito gosto por saber de sua preferência por ele. O bom mesmo é saber de sua curiosidade nas suas "experimentações" gastronômicas e as decepções fazem parte do trajeto. Quando tiver vontade de comer arroz gostosinho acho que vai ter fazer ou que vir na sua casinha aqui em BH e mamãe o fará com muito gosto. Beijo!

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  4. Hoje comi pela primeira vez na ufmg, na música.
    Fiquei impressionadíssimo com a qualidade da comida em comparação a qualidade e preço do que temos lá na guignard.
    Mas isso aí que te serviram... medonho.

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  5. o macarrão da música é SENSACIONAL! que saudade...

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  6. Não comi macarrão lá.
    Mas ouvi sobre a fama do macarrão da FACE, que gerou polêmica e foi praticamente proibido de ser vendido em função das filas enormes que se formavam para compra-lo.
    =O

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  7. Cacilda, que nojo dessa comida, puotz! XD.
    Mas assim como dito ali em cima adorei o nome "Transmontana" heheheheh

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